4 de julho de 2012

Medo...

 Corro de forma estranha em cima dos parágrafos da vida, em cima de cada estrofe já escrita, fingindo que nada do que ficou lá trás me atinge, me molda e desenha sombras estranhas na alma. Sobrevoo as palavras com medo de lhes tocar, parar nas virgulas e respirar mais do que devo, antes que a mesma respiração faça uma travagem de ponto final. Aproximo-me devagar, lentamente como quem deseja apenas admirar sem acordar, sinto o odor, o aroma, as sensações de nudez de uma essência pura, e fujo, sem lhes tocar com medo de elas se abrirem e me fascinarem de tal modo que seria impossível resistir. Calço as exclamações num pé, as interrogações cheias de dúvidas no outro, e corro por entre o emaranhado de textos sem nexo aparelhados com as ideias fora do lugar. Ao longe, corre o rio sereno de figuras de estilo, prontas a serem pescadas pelo isco preso no anzol de uma cana que se mantém firme e estática, sem ser lançada. E eu corro, pulando de canal em canal, de sensação em sensação, olhando as palavras de longe, mirando-as, seduzindo-as talvez, numa lânguida tentativa de lhes pertencer, de as tomar como minhas, de as abraçar infinitamente e sem pressa de largar. Corro, sofregamente por entre os espaços soltos no meio das palavras, tentando que elas não notem a minha passagem, quiça se esqueçam da minha presença, inerte entre os profundos suspiros dos pontos e virgula. Quero respirar mais um pouco, e páro, estática na beira do rio, debaixo da sombra de uma árvore, já gasta pelo tempo que os milénios que se fizeram sentir, e de uma só golfada de ar, inspiro o oxigénio necessário para correr de novo, até às próximas reticências...