27 de fevereiro de 2013

Dos dias sem dias...

Dos dias que me enlaçam a alma, dos dias que me enobrecem de cores douradas e me esticam as mãos para mais um dia de caminhada. As horas que estremecem à minha passagem, e me sugam a dor, e o ardor com que o prazer me atinge a alma apenas numa frase ouvida, sussurrada pelo vento de cada vez que as folhas se desprendem das árvores, se estendem no chão com um tapete aveludado. Dos dias que a água morna se faz fria, e me arrepia o corpo, sedento de sentir a língua enrolada em si mesmo, numa masturbação insólita e enlouquecedora, como uma serpente rastejante que se aloja no seu ninho. Dos dias que a alma se escondem do sol radiante, e floresce na noite escura, em gestos lânguidos, ávida de se sentir vida. Dos dias que rastejam sorrateiramente por debaixo da pele, pisando-me a alma como um animal selvagem, rugindo e estilhaçando os vidros dos labirintos internos da vil embalagem do ser. Dos dias que o ritmo diário me mantém na marcha esperançosa de ser a cada esquina o que sonho e desejo, com a força de uma onda gigante que abraça a areia, e deixa o seu rasto de sal. Dos dias em que me entrego sem freio, sem amarras, sem correntes, onde apenas e só eu actuo, sou realizadora e actriz principal. Dos dias que me agarro a ti, mão silenciosa que jamais me abandona, e que jamais deixará de ser o meu prumo, o meu mastro ancorado em terra, da certeza de apenas ser. Dos dias que me perco nos pensamentos e imagens reflectidas no espelho onde tu estás, e te sei de cor, em cada traço, em cada lágrima salgada lambida, dos dias em que o desejo me consome a mente, e a deixa a alucinar por mais uma onda de prazer imaginado, sentido, sofregamente sufocado entre suspiros (im)partilhados. Dos dias em que o abismo me engole, e eu aceito sangrar sem dó ou piedade, na tentativa derradeira da solidão morrer. Dos dias sem horas... serenos e doces, que me sorriem e devolvem o brilho ao olhar, sem esforço algum...